terça-feira, 11 de março de 2008

O QUE DEVE SER UMA REFORMA TRIBUTÁRIA ?

Por Paulo Rubem Santiago


Encontra-se em discussão na Comissão de Cidadania e Justiça da Câmara dos Deputados uma proposta de emenda constitucional enviada pelo governo federal.

A matéria visa uma nova reforma tributária, a segunda sugerida pelo governo LULA.
A primeira foi enviada em 2003, junto a Proposta de Emenda Constitucional que tratava da reforma da previdência.

À primeira vista o assunto parece árido, difícil, próprio de especialistas, o que afastaria a participação da população e das entidades civis não profissionais do tema na análise da matéria.

Mas esse não é tema proibido aos mortais comuns. Pelo contrário, deve ser assumido como um desafio, um divisor de águas entre os interesses populares e de emancipação social e os negócios da acumulação das tradicionais oligarquias financeiras, credores da dívida pública, autênticos tubarões engordados pelos juros dos títulos públicos.

Algumas perguntas devem ser estabelecidas como referência elucidativa para ampliarmos a compreensão do tema.

A primeira delas :

1. Para que servem os impostos e as contribuições que a sociedade transfere ao Estado, arrecadados pelas secretarias de finanças municipais, da fazenda dos estados e receita federal do Brasil ?

Impostos e contribuições formam a chamada "carga tributária" e são estabelecidos pela Constituição e pela legislação infra-constitucional com o objetivo de financiar as ações dos poderes executivo, legislativo e judiciário, visando atingir os objetivos definidos pela Constituição Federal para cada ente do estado.

2. Como são definidos esses impostos e contribuições ?

São definidos na CF e nas leis que a regulamentam. Têm características próprias, estão relacionadas a determinados "fatos geradores" do tributo e com tais perfis têm incidência maior ou menor sobre as diferentes classes de renda e patrimônio existentes em nossa sociedade. Além disso devem responder ao princípio da justiça fiscal, ou seja, quem tem mais deve pagar mais, quem tem menos deve pagar menos.

3. Algumas conribuições têm fins específicos ?

Sim. Alguns impostos têm sua receita dividida para constituirem fundos também específicos.Por exemplo, as receitas oriundas da arrecadação do Imposto de Renda-IR e do Imposto sobre Produtos Industrializados-IPI são divididas para a formação dos fundos de participação dos estados e municípios, segundo regras e percentuais estabelecidos na CF de 1988.

As atuais contribuições PIS-COFINS e CSLL ( contribuição sobre lucro líquido )e a extinta CPMF eram destinadas para programas de saúde, combate à pobreza e assistência social. Para a previdência social privada recolhem-se as contribuições patronais e de trabalhadores junto ao INSS, estando, porém, a previdência, inserida na seguridade social, segundo a CF de 1988.

4. Todos pagam impostos de forma igual ?

Não. Enquanto trabalhadores que consomem alimentos, luz, água, telefonia e combustíveis, por exemplo, pagam impostos no ato da compra nos mesmos percentuais das classes mais ricas, os membros dessas classes muitas vezes se eximem de recolher impostos, sobretudo no setor atacadista, de recolherem o imposto de renda e inúmeras contribuições, apelando para leis de parcelamento de débitos fiscais, quando conseguem deixar de recolher impostos, parcelar o débito, obter perdão e redução de multas, provocando enormes rpejuízos aos cofres públicos.

5. Como as elites driblam as leis e evitam pagar impostos ?

Para isso as leis tributárias são esmiuçadas detalhadamente. Cada artigo, cada parágrafo, cada alínea, casa inciso é revirado de dentro para fora e assim são encontradas brechas que terminam por garantir às empresas a possibilidade de realizarem o que chamam de "planejamento triutário".
Quando os impostos deixam de ser recolhidos sob esses argumentos, ocorre a "evasão fiscal". Há também a atitude deliberada de sonegar, de fugir do recolhimento do imposto devido aproveitando-se das falhas da administração tributária, da lentidão da máquina de arrecadação fazendária e até a ausência de normas punitivas duras contra quem sonega. E é claro, quanto mais frágil for o Poder Judiciário para executar a dívida de impostos e contribuições, mais os empresários procurarão sonegar impostos e contribuições. Há os casos de empresas verdadeiras, legalizadas, que existem de fato e que sonegam e outros casos, de empresas de fachada, criadas apenas para recolher impostos dos consumidores e transferi-los para contas fantasmas ou paraísos fiscais fora do país.

6. Para uma reforma tributária vingar será que basta haver projetos mudando o total de impostos existentes, suas alíquotas ou a incidência desses impostos em determinadas transações ?

Não. É preciso que toda e qualquer mudança no tipo de impostos, suas alíquotas e incidência seja acompanhada de um sistema geral de proteção do tributo, evitando brechas e facilidades aos que delas se aproveitam para acumular fortunas e mais fortunas com a sonegação criminosa.

7. Que linhas gerais devem prevalecer rumo a uma reforma tributária que expresse justiça fiscal ?

Em primeiro lugar a substituição progressiva do peso dos impostos indiretos ( sobre o consumo, p.ex. ) pelos impostos diretos, sobre a renda, o patrimônio, o lucro, as grandes fortunas e a herança.

Em segundo lugar o fortalecimento da administração tributária como administração de carreira, imune ao contingenciamento orçamentário, aos cortes de verbas e a desvinculação de receitas da união, a DRU.

Em terceiro lugar, a deflagração de um processo geral de auditoria dos sistemas de incentivos fiscais até hoje concedidos, evitando-se a prática generalizada de concessão de benefícios e incentivos sem o efetivo monitoramento de seus resultados.Junto a isso, o fim da guerra fiscal predatória.

Em quarto lugar a exigência de que toda a administração tributária e a execução orçamentária das receitas sejam realizados de forma transparente, com página na internet, estimulando-se o controle social sobre a matéria tributária-orçamentária.

Tais diretrizes seriam acompanhadas pela inclusão no desenvolvimento curricular da educação básica e do ensino superior do conhecimento transversal sobre os assuntos das finanças públicas e do orçamento, visando à formação cidadã de todos os estudantes e da juventude, formando novos valores quanto à responsabilidade fiscal de cada um e de todos, na construção de uma sociedade mais justa e igualitária.

Na próxima semana apresentaremos emendas ao projeto da reforma tributária visando adequá-las a essas diretrizes aqui defendidas.

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