quarta-feira, 2 de julho de 2008

Mudanças Climáticas e o papel das Cidades nas Políticas Públicas




Nosso blog publica com prazer o excelente trabalho do professor e colaborador, Prof. Dr. Heitor S. Costa, da UFPE.

Boa leitura e vamos às providências para construir as sugestões apontadas pelo professor.
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Mudanças Climáticas e o papel das Cidades nas Políticas Públicas


Heitor Scalambrini Costa (*)

* Físico, doutor em energética, professor do Departamento de Engenharia Elétrica e Sistemas de Potência – Universidade Federal de Pernambuco


Apresentação


Os estudos do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas - IPCC apontam a ação humana como sendo a maior responsável pelo aquecimento do planeta. Concentrações atmosféricas globais de dióxido carbônico, metano e óxido de nitrogênio têm aumentado muito como resultado das atividades humanas desde 1750, inicio da Revolução Industrial. Segundo o IPCC, o aumento global das taxas de emissões de gases de efeito estufa (GEE); se devem principalmente, ao uso intensivo dos combustíveis fósseis, práticas e tipos de agriculturas inadequadas, áreas imensas para uso de pastagens, desmatamentos e queimadas desregradas nas florestas e consumo perdulário de energia elétrica nas cidades. Nos relatórios IPCC/2007 estão descritas em detalhes as terríveis previsões sobre secas, inundações, tempestades, doenças, extinção de espécies, aumento do nível do mar e desgraças afins.

A sociedade mundial começa a perceber que o aquecimento global, ou seja, uma mudança significativa no clima da Terra, é um problema real e sério. Vamos precisar enfrentar o assunto de mudanças climáticas com ações decisivas, ou falhar como outras sociedades falharam no passado.

Hoje sabemos que é necessário criar e implementar políticas públicas direcionadas a redução das emissões dos GEE relacionadas às mudanças climáticas tanto em escala nacional como regional e local, podendo ser divididas em dois eixos de ações: mitigação e adaptação.

Não pode ser só adaptação. Se as mudanças continuarem a aumentar, podemos chegar a um ponto sem volta. Precisa-se rapidamente de uma ação muito enérgica de redução das emissões de gases de efeito estufa, principalmente do CO2.

As cidades são responsáveis por 75% da energia consumida no planeta, e nas 40 maiores metrópoles, 35 a 50% da energia é desperdiçada por ineficiência das edificações, segundo a Conferencia Municipal de Produção mais Limpa (22/08/2007). As cidades são tremendamente ineficientes e lutar contra isto requer vontade política e organização prática. Além da energia elétrica, os sistemas de água também têm perdas de 35% com vazamentos, inclusive em cidades como Londres e Paris.

Devemos ter consciência de que o desenvolvimento urbano deve implicar na preservação máxima do ambiente natural e que envolve uma série de soluções nos vários setores para que se tenha melhores condições de qualidade ambiental.


Ações municipais

As medidas de Mitigação envolvem a redução das emissões dos GEE de forma a atingir diretamente a causa do problema. Esse processo se dá em longo prazo e o nível de decisão é governo federal envolvendo acordos internacionais.

Já as medidas Adaptativas estão relacionadas aos benefícios regionais e locais, o qual deve ser tratado de maneira pragmática, inclusive com o desenvolvimento de cenários alternativos que levem em conta as necessidades do desenvolvimento sócio-econômico-ambiental. As medidas Adaptativas não são direcionadas apenas em consideração ao aquecimento global, mas também a variabilidade climática atual e eventos extremos, como ondas de calor, tempestades, enchentes e ciclones.

As ações envolvem a recuperação de áreas degradadas, proteção das matas ciliares e nascentes, saneamento básico nas cidades e zonas mais pobres, redução do consumo de energia elétrica e o melhoramento da eficiência nas edificações e podem ser empregadas como parte de iniciativas setoriais na área de Recursos Hídricos, Infra-estrutura, Ocupação do solo e Saúde.

A inter-relação entre mitigação e adaptação pode ser dar em diferentes níveis, temos como exemplo algumas ações:

• O uso do ar condicionado nas edificações: - efeito negativo sobre mitigação;

segundo o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (UNEP), o setor de construção civil é responsável por cerca de 30 a 40% do consumo global de energia nas edificações. O Brasil é o sexto país que contribui com emissão de CO2 neste setor da construção civil (308 milhões de toneladas de CO2/ano). O relatório Building and Climate Change publicado no início de 2007 ressalta que mais de um quinto do consumo de energia e mais de 45 milhões toneladas de CO2 poderiam ser economizados por ano até 2010 com a aplicação de medidas adaptativas para prédios novos e já existentes.

• O uso de técnicas para climatização natural, utilização de materiais de melhor desempenho térmico nas construções e uso de materiais reciclados de prédios, adequação do tamanho e da forma do prédio para seu propósito de uso:

- efeito positivo sobre mitigação; para alcançar maior eficiência energética em prédios, não é preciso usar soluções tecnológicas avançadas e caras, soluções simples como projetos inteligentes, soluções flexíveis de energia e fornecimento de informação apropriada aos usuários do prédio; Exemplos: a substituição de lâmpadas incandescentes por lâmpadas comuns, sistemas inteligentes para uso da água na residência como por exemplo o reuso de água pluviais, lavagem de pisos externos em sanitários e descarga econômica passam a economizar de 4 a 5 litros por pessoa por dia, sendo que o normal é de 9 a 10 litros por pessoa.

• O incentivo a substituição dos chuveiros elétricos e “boilers” pelos sistemas de aquecimento de água com energia solar. Experiência internacional tem baseado a promoção da energia solar na criação de: subsídios (prêmios e linhas especiais de crédito), medidas de apoio (campanhas públicas, educação ambiental, ....), incentivos fiscais e obrigação legal de instalação ou preparação da instalação. Logo, leis devem ser criadas neste sentido, por exemplo, redução no IPTU para quem instalar sistemas solares. O incentivo ao uso da eletricidade solar também deverá ser promovido, para complementar o uso da eletricidade convencional no município.

• Inovação tecnológica nos transportes coletivos e mais incentivos a transportes públicos, medidas restritivas ao uso do automóvel particular através de pedágios urbanos e da maior taxação, o estímulo ao uso de veículos híbridos gasolina/eletricidade, o uso de biocombustíveis e o aumento da eficiência dos motores:


Outros procedimentos também podem ser adotados, como:

- dirigir de forma adequada;
- utilizar veículos mais eficientes;
- revisar o veículo periodicamente, como por exemplo, pneus calibrados economiza combustível;
- revisar a emissão de gases do automóvel; e
- reduzir o uso do ar-condicionado.

• Arborização urbana e o uso de espécies nativas para preservação da biodiversidade e minimiza ilhas de calor: - terá efeito positivo sobre a adaptação. O fenômeno das Ilhas de Calor manifesta-se no aquecimento desigual das diversas regiões urbanas, de acordo com o tipo de construção e disponibilidade de áreas verdes e uso do solo. Nas regiões densamente ocupadas por prédios, avenidas e pouco arborizadas, o calor é refletido por materiais como vidro, metais e por partículas poluentes gerando um clima urbano com temperaturas elevadas.

O Cinturão Verde pode ser uma das propostas nas áreas circunvizinhas urbanas favorecendo a estabilização ou minimização da desestabilização das condições ambientais de vida de toda a região para a estabilidade climática, biodiversidade, recuperação atmosférica, suprimento de água e proteção dos mananciais, proteção contra erosão do solo, assoreamentos e reserva de patrimônio ambiental.

• Aplicação dos Instrumentos do Estatuto da Cidade para incentivar, como a ocupação ambientalmente correta dos vazios urbanos evitando-se a especulação imobiliária; a reutilização de prédios abandonados para desenvolvimento de atividades sócios-educativas-ambiental, reestruturar área urbana com finalidade de criação de novas áreas de lazer e entretenimento com predominância de vegetação, áreas especiais de interesse paisagístico e áreas especiais de preservação ambiental: - efeitos positivos sobre adaptação;

• Identificar e monitorar o Potencial de Espaços Verdes públicos por micro-regiões urbanas, pois não basta cumprir as exigências legais de percentuais de áreas verdes, porém zelar por uma distribuição homogêneas dessas áreas formando parques e não pequenas praças isoladas; manter um monitoramento do índice verde por habitantes considerando as áreas efetivamente urbanizadas: - efeitos positivos sobre adaptação;

• A educação ambiental é um eixo fundamental para a conscientização e mudanças no padrão de comportamento de cada indivíduo sobre a preservação ambiental na vida cotidiana.

Para isso é destaca-se:

- a participação comunitária nas discussões sobre a qualidade ambiental na cidade e zona rural;

- a criação de programas de educação ambiental para e com a comunidade local;

- o incentivo nas escolas de ensino fundamental e nas universidades para a discussão com alunos sobre os problemas ambientais do município, com inclusão de disciplina opcional de educação ambiental;


Logo os dois eixos de medidas (mitigação e adaptação) devem ser empregados de forma integrada para reduzir os riscos de mudanças climáticas na natureza e seus efeitos na comunidade, por isso suas ações não devem ser isoladas. É preciso que haja um Plano Nacional de Mitigação que compreenda a redução dos GEE e adaptação para combater as causas do aquecimento global a nível municipal. São ações que podem ser iniciadas com a elaboração do Mapeamento da Vulnerabilidade Ambiental nas cidades brasileiras e até para cumprir o estabelecido na Agenda 21.

O desenvolvimento de cenários alternativos pode auxiliar nos planos de ações adaptativas e mitigadoras levando em conta as necessidades do local e estabelecer estratégias para atingi-las. Embora os cenários não sejam modelos preditivos, o seu objetivo principal é identificar o que pode ocorrer, levando as pessoas a pensar em caminhos alternativos para um futuro desejável sob o enfoque do desenvolvimento sustentável.


Jaboatão dos Guararapes: Cidade Solar

A substituição da energia elétrica utilizada para aquecimento de água – hoje responsável por 8% do consumo nas residências do país – por aquecimento solar, pode gerar uma economia para o pais de mais de 450 mil MWh de energia elétrica.

A exemplo do que já acontece em países como Espanha, Portugal, Israel, México, Índia, Austrália, Alemanha, Áustria, China, Estados Unidos, Japão entre outros, a iniciativa Cidades Solares visar criar uma legislação municipal que incentive o uso de aquecedores solares em substituição a chuveiros ou aquecedores elétricos ou a gás, além do uso da eletricidade solar em domicílios e prédios públicos. Iniciativa brasileira já conta com projeto de lei e leis aprovados de apoio em municípios como Gramado, Porto Alegre, Curitiba, Florianópolis, Belo Horizonte, Campo Grande, Campina Grande, Rio de Janeiro, Salvador e mais de 40 cidades.

Nossa proposta é que Jaboatão dos Guararapes (Caruaru) se torne Cidade Solar através de adoção de leis que venham a apoiar, incentivar e beneficiar o uso da energia solar, através do aquecimento de água e/ou da produção de energia elétrica solar.

Este programa, além da adoção de legislação concernente, terá ampla campanha educativa para a população, preparação de material didático para os professores da rede municipal, instalação de protótipos de equipamentos para efeitos demonstrativos, entre outras medidas que visam a informar, educar e capacitar os gestores municipais, os professores e a população em geral.


Conclusões

O desenvolvimento sustentável (para que? e para quem?) é um conceito crucial, presente na pauta das grandes questões globais, associado à preservação de recursos para as gerações futuras. A população mundial atual de 6,4 bilhões de habitantes, e a previsão é de que em meados do século XXI esse número seja de 9,5 bilhões de pessoas, exige que para melhores condições de vida mais saudável não adote-se uma lógica contraria a uma lógica de crescimento econômico a qualquer custo.

O Brasil com uma população de 186 milhões de habitantes (IBGE, 2006) é muito
vulnerável e não está preparado aos efeitos danosos do aquecimento global.

Aos municípios cabem as responsabilidades de elaborar Planos de Ações e Estratégias visando a qualidade ambiental na cidade e contribuir para o equilíbrio do nosso planeta.

A iniciativa na elaboração de políticas públicas e ações exige estratégias para desenvolvimento urbano nas cidades brasileiras. Algumas questões devem ser tratadas:

- Ampliar e difundir o debate concernente às mudanças climáticas e o uso de fontes de energia renováveis nas diversas regiões do país conjuntamente debatidas entre a população, representantes da sociedade civil, área acadêmica e o legislativo;

- Aprofundar o debate sobre as questões relacionadas ao Desenvolvimento Regional e desenvolver propostas de programas e ações de MDL (projetos de Mecanismo de Desenvolvimento Limpo);

- Lançamento do programa Jaboatão: Cidade Solar;

- Atuar como catalisador das discussões concernentes às definições de estratégias nacionais de desenvolvimento;

- O uso de geotecnologias para gerar informações, análises e avaliações espaciais;

- Publicar um relatório anual do município de um balanço ambiental para apresentar seus Inventários de Emissões, utilização da biomassa e preservação ambiental.

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