quinta-feira, 9 de abril de 2009

Há um Congresso mas não há uma "classe política"

Por Paulo Rubem

Nas últimas semanas boa parte da imprensa brasileira tem dedicado enorme espaço às denúncias sobre gastos de parlamentares com passagens, alimentação, combustíveis etc, sob o manto da desconfiança acerca da idoneidade dos documentos que comprovam tais despesas. Não há um só dia em que alguns jornais não batam nessa tecla.

De forma simplista e oportunista deixam de explicar aos leitores que mais de 75% do Congresso é constituído de deputados e senadores que são empresários de todos os ramos, alguns com processos no STF por vários tipos de crimes, e que não estão no Congresso apenas por interesse público, pelo salário ou pelas verbas de gabinete.

São muitos os que se dedicam, sobretudo, à mudança das leis de modo a acumular benefícios, sejam fiscais ou financeiros, quando votam regras de financiamento de empresas pelos bancos públicos, como BNDES, BB e CEF, ou a chance de renegociação de dívidas tributárias e previdenciárias, por exemplo.

Além disso há outros tantos, financiados por grandes empresas, que buscam interferir na programação de gastos públicos, na comissão mista de orçamento, com emendas para a construção de rodovias, obras de infra-estrutura e outras do gênero, para que mais negócios e despesas sejam feitas para setores com os quais mantêm relacionameneto político-eleitoral. Assim mesmo, de forma direta, sempre em nome do desenvolvimento de seus estados e regiões.

Para esses, o salário de deputado ou as verbas para manter o mandato em funcionamento não representam muito.

Por isso é preciso afirmar, numa outra direção, que os mandatos de origem popular, oriundos das lutas sindicais e sociais estão no Congresso para fazer avançarem as conquistas sociais, os direitos humanos, as transformações econômicas na direção da distribuição de riquezas e da justiça social. Nessa batalha frequentemente se chocam com outros grupos de interesse na sociedade e no próprio parlamento.

Esses parlamentares em geral não têm outras fontes de renda pessoal, talvez uma aposentadoria, nem acumulam patrimônio em função do exercício de mandatos.

Por isso é necesssário, no exercício da função pública e para manterem a independência e a correta comunicação de suas atividades, com permanente contato com as bases que representam, que tenham recursos para o desenvolvimento das atividades do mandato, separados dos vencimentos que recebem.

Se há parlamentares que fraudam gastos para acumulam riquezas, que sejam investigados e punidos mas não há como aceitarmos a hipocrisia de certos setores da mídia que tentam nivelar por baixo os mandados representativos, jogando uma onda de ataques e de esvaziameneto da representação popular na democracia.

As elites econômicas que gastam fortunas em suas campanhas não estão preocupadas com os ataques da mídia pois seus votos são negociados com lideranças regionais, prefeitos e outros grupos políticos, com muito dinheiro em jogo.

Por isso é essencial a realização de uma reforma política que aponte para o financiamento público de campanha e a existência de democracia direta nos partidos, com direito do eleitor revogar mandatos que se exerçam contrários aos discursos de campanha e de palanque.

Há um Congresso eleito no país mas seus integrantes não são uma "classe política", unitária, sendo, isto sim, um conjunto de grupos de interesses, muitas vezes em conflito permanente entre si mesmos.

Da ação desses grupos e da pressão ou omissão da sociedade é que se desenham, se reforçam ou se transformam as estruturas econômicas e sociais vigentes no país, reduzindo-se ou aprofundando-se as desigualdades.

Muitas vezes, um único artigo alterado num projeto de lei significa expectativa de ganho de muitos milhões de reais para certos grupos econômicos. É para isso, na verdade, que esses grupos financiam campanhas e elegem seus representantes.

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