domingo, 26 de outubro de 2008

Após 2008, o que fazer ?
















Por Paulo Rubem

Fechado o mapa eleitoral municipal das eleições de 2008, com os resultados já consolidados do 2o. turno ocorrido neste domingo, é hora de se perguntar o que se fará, de fato, para mudar, a vida de milhões e milhões de brasileiros sem casa, saneamento, segurança, habitação,escola e saúde ?

Uma eleição como essa, onde a disputa local é, quase sempre, ancorada pelas máquinas de quem já era Prefeito, de aliados no governo estadual e no governo central, fica muito dificil dizer que os vencedores o foram, sobretudo, por seus projetos de governo e por seus próprios méritos.

Depois que as campanhas passaram a sair do colo dos especialistas em marketing, nada mais provável que, com muito dinheiro, um perfil leve, um governo feijão com arroz(para os que concorreram à reeleição)e as máquinas locais, estadual e nacional ao seu lado, um candidato consiga vencer o pleito.Isto é, desde que não tropece em suas próprias ferramentas de marketing,como ocorreu com Marta Suplicy em São Paulo, ao questionar se Kassab era casado e se tinha filhos.

Passada a batalha pelo voto inicia-se a batalha pela construção do que se propôs em campanha.
Bem,as regras são iguais para todos. O financiamento da saúde, seu custeio e a expansão e melhoria dos serviços dependem dos percentuais a serem aplicados, para os três níveis de governo, pela Emenda Constitucional 29, dependem de uma gestão eficaz e do combate profundo à corrupção no setor.

Na educação idem, com a Emenda 53, que criou o Fundeb, Fundo de Manutenção da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação e sua regulamentação definida pela Lei 11.494, de 2007.

Mais crianças nas escolas, das creches ao ensino fundamental( 100% ?),melhores indicadores de aprendizagem e desenvolvimento do conhecimento, escolas, para isso, mais bem equipadas, são aspectos que não surgirão por milagre nem num passe de mágica ou de marqueting.

O saneamento só avançará, por sua vez, se nossos novos prefeitos foram capazes de ocupar todos os espaços que lhes foram reservados nas normas da nova lei federal para o segmento. Quantas de nossas capitais têm serviços autônomos de água e esgoto, em quantas cidades dependemos das empresas estaduais do setor e quantas são, hoje, as concessões para que empresas privadas operem esses serviços nos municípios ?

Quanto será captado, nos próximos quatro anos, via PAC ou não, junto ao governo federal, seja através do orçamento fiscal, do BNDES ou da CEF, para que as capitais dêem um salto de qualidade e de universalidade no abastecimento de água e no saneamento, ai envolvidos a coleta e o tratamento de esgoto,a coleta e o tratamento dos resíduos sólidos ?

Na segurança pública o desenho é, cada dia mais, desafiador. Embora haja sinais consistentes de que a arquitetura para a segurança pública construída nos últimos anos pelo governo federal possa dar resultados com o PRONASCI, nossas capitais e regiões metropolitanas precisam, cada vez mais, de infra-estrutura urbana, de habitação saudável,de praças, áreas iluminadas, centros culturais, oportunidades de formação profissional conjugadas com a conclusão do ensino médio, áreas de esportes e de lazer, regularização fundiária, serviços públicos de inclusão e promoção social, competindo e vencendo a exclusão que pode gerar marginalidade, áreas sem-estado, quartéis generais do tráfico, do crime e da cooptação dos mais jovens para a violência.

Será que tais demandas terão lugar de destaque na execução dos gastos públicos ?
Evidente que não.

Os gastos públicos estão tutelados, desde 1988, na Constituição Federal, artigo 166, parágrafo 3o., Inciso II, " b ", pela supremacia dos pagamentos dos serviços da dívida pública, despesas sem restrição de limite, nos termos da Lei de Responsabilidade Fiscal, de 2001. É ao mercado que nossas contas e o tesouro nacional procuram atender primeiro. E nessa verdadeira tutela antecipada sobre o destino da arrecadação de impostos e contribuições, toda uma rígida diretriz tem sido seguida desde 1999, com a imposição da formação de elevados superávits primários, voltados para a tentativa(ainda não atingida)de se conseguir pagar de tempos em tempos,toda a conta de juros devidos pelos títulos públicos emitidos pelo tesouro nacional.

Além disso, é cavalar o que se transfere das receitas nacionais para a amortização da dívida correspondente a tais títulos. Acesse www.inesc.org.br e confira.

Mudanças sociais têm um custo para as contas públicas e para a própria sociedade.

Construir casas para quem mora nas favelas e sanear bairros inteiros tem um custo.Atender 100% das famílias com a estratégia da saúde da família, dar cobertura integral à população através dos Agentes Comunitários de Saúde idem.

Ao mesmo tempo, para assegurarmos 100% de matrículas, com repetência, evasão escolar e distorção idade-série irrisórias, precisaremos de novos investimentos nos próximos quatro anos, para que sejam atingidas essas metas.

Renova-se, por isso, ante tais conflitos, o desafio do exercício do poder que deriva da democracia direta, prevista no parágrafo único, do artigo 1o. da Constituição Federal.

Um exercício cotidiano, pela efetiva aplicação das leis de caráter interventivo nas desigualdades sociais vigentes, pois nenhum dos atuais blocos dos vencedores dessas eleições e, certamente, nenhum dos que se formará para buscar novas vitórias já em 2010, assumirá o compromisso e fará campanha afirmando defender uma ruptura com a ordem do mercado nas contas públicas.
Vão, mais uma vez, "fazer o dever de casa", e, quem sabe, o futuro Congresso eleito daqui a dois anos não tenha apenas 55% de seus integrantes, mas 60% ou 70% financiados pelas mesmas 220 grandes corporações empresariais que financiaram o atual Congresso, para tê-los ao seu lado e em defesa de suas bandeiras, interesses e causas.

Ai estão, como já afirmamos, por isso,as leis da saúde, da educação, da habitação de interesse social, a Lei Maria da Penha, do saneamento, os estatutos das cidades, da criança e do adolescente, do idoso, a lei da agricultura familiar, a lei das regras para a previdência social de estados e municípios, para que o povo os conheça e deles possa se apoderar.

Ai estão os processos de elaboração do orçamento público, que anualmente passam pelas Câmaras Municipais, Assembléias Legislativas e pelo Congresso Nacional.
Na prática, tudo isso é mais significativo para a vida das pessoas do que o simples voto nas eleições, hoje, cada vez mais, pautadas pelas máquinas de governo, pelo dinheiro, pelas distorções da mídia, controlada por reduzido número de empresas e famílias nas grandes redes.

O grave de tudo isso é percebermos que os partidos, de quase todos os desenhos político-ideológicos, estão ficando muito parecidos. Raras são as inovações que revelam uma salutar combinação entre governar invertendo prioridades e, no espaço interno do governo, manter o espírito público, coletivo, isonômico. Quase sempre, o ato de vencer uma eleição e chefiar um governo redunda em formação de grupos fechados de poder, para as tendências ou correntes, seja de matriz pessoal, econômica ou ideológica, privatizando-se o espaço público de poder. No PT, por exemplo, isso é, cada vez mais, cristalino.

Os partidos que se reivindcavam de esquerda, democráticos ou socialistas, já não dedicam tanto tempo de suas ações, para a formação de instâncias de poder pelas bases, de processos de formação política, de afirmação de novas concepções de fazer político, de rodízio de lideranças e de potenciais candidatos a gestores e legisladores.

O atual governo Lula se encerra em 2010 e duvida-se mesmo se até lá o PT terá o empenho necessário( que não teve até agora) para puxar uma autêntica reforma tributária, uma ousada reforma política, uma verdadeira reformulação da estrutura de poder dos atuais detentores de concessões de comunicação, um necessário redesenho das finanças públicas, sua arrecadação e distribuição segundo as necessidades do País e da sociedade e não para atender à supremacia dos grupos do "mercado".

Por isso, enquanto os vencedores comemoram e seus grupos políticos fazem planos para 2010, os que sonham com uma sociedade mais justa, radical e diretamente democrática em todos os sentidos, devem seguir reinventando a política no dia a dia, com formação, criação de estruturas de base, denunciando os limites e as disparidades desse atual modelo democrático-eleitoral vigente, cujos sistemas de receitas e despesas públicas (segundo o Projeto de Lei do Orçamento Federal) poderá realizar, em 2009, 14% de despesas com juros e amortizações, ocupando outros 33% com refinanciamento da Dívida Pública, o que dará R$ 233,2 bilhões para a primeira demanda, somando-se , com a segunda(refinanciamento) encargos de R$ 758,7 bilhões !.

Um comentário:

Anônimo disse...

Paulo Rubem,
Você como sempre muito coerente nas suas colocações.
Parabéns! Admiro muito sua luta por justiça social, igualdade e cidadania!
Como diria o grande Vinícius de Moraes:
"Se todos fossem iguais a você
Que maravilha viver...
Existiria verdade,
Verdade que ninguém vê
Se todos fossem no mundo iguais a você".