quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

LUTA PELA EDUCAÇÃO BÁSICA DE QUALIDADE SOFRE DERROTA NO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL













Por Paulo Rubem


Lamentável, injustificável, inexplicável !

Assim posso expressar minha profunda discordância com a decisão do Supremo Tribunal Federal, ocorrida ontem, em relação à Ação Direta de Inconstitucionalidade apresentada por cinco governadores contra vários aspectos da Lei Federal que instituiu o PISO SALARIAL NACIONAL para os profissionais da educação básica.

Assistimos na tarde de ontem, por mais de duas horas, a manifestação de voto da maioria dos Ministros.

Nesta oportunidade, contudo, quero registrar especialmente a satisfação pelo Parecer emitido pelo Relator, Ministro Joaquim Barbosa e o voto apresentado pelo Ministro Carlos Ayres de Brito.

Em suas manifestações, o Relator e o Ministro Ayres de Brito rechaçaram a tese da inconstitucionalidade requerida pelos governadores.

Entenderam os Ministros aqui citados que a instituição do PISO, a afirmação da carga horária máxima de 40hs semanais e suas divisão entre 2/3 para atividades em sala de aula e 1/3 para estudos e preparação docente não ofendiam a Constituição da República, especialmente no tocante à autonomia dos estados e municípios.

Ao observarmos os votos de outros Ministros, sinalizando que a divisão da carga horária determinada pela Lei Federal do PISO, a Lei 11.738 de 2008, era inconstitucional, parece-nos que suas Excelências não entenderam, não analisaram, ou mesmo, não leram detalhadamente todos os documentos jurídicos relacionados com a matéria, aqui referindo-me à própria Constituição Federal de 1988, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, a Lei Federal 9.394, de 1996, o Plano Nacional de Educação, Lei Federal 10.172, de 2001, o FUNDEB, criado pela Emenda Constitucional 53, de 2006 e a Lei Federal 11.494,de 2007, que regulamentou o FUNDEB,

Houve Ministro que ainda abordou o ensino usando nomenclatura que não mais existe na classificação das séries da educação, ao se referir ao "lo. grau e 2o. grau" ou referindo-se à educação básica como um sinônimo das séries iniciais da educação infantil.

Ao mesmo tempo houve repetidas referências à especificidade das receitas de cada município, sobretudo as cidades mais pobres, como um impecilho à adoção da divisão 2/3 - 1/3 da carga horária de trabalho, demonstrando-se desatenção com a norma da Emenda Constitucional 53, pela qual se criou o FUNDEB e através da qual se assegura a complementação da União aos gastos de estados e municípios que excederem suas contribuições próprias ao Fundo, em valores mínimos descritos na Emenda.

Prevalecendo a concepção passiva, estanque e estática de federação defendida por alguns Ministros, cada município e estado adotará a divisão da carga horária que for mais econômica para suas finanças, mesmo com o FUNDEB complementando-as.

É de se perguntar por que um professor de 5a. série, formatura em licenciatura,que leciona matemática em Calumbi, no sertão de Pernambuco, cidade com poucas receitas, pode ter apenas 10% de sua carga horária contratual remunerada para estudos, reciclagem e preparação de aulas, enquanto um mesmo professor, da mesma série e da mesma disciplina, em Belo Horizonte, cidade com mais receitas, poderá ter 30% de sua carga horária remunerada para estudar e preparar aulas, reciclar-se e realizar pesquisas ?

Prevalecendo essa visão passiva de federação, vamos perpetuar as desigualdades intra-regionais e inter-regionais. Sabe-se inclusive, com estudos e estatísticas amplamente publicados, que a precariedade da educação básica oferecida no País tem sido uma das maiores causas do aumento de violência e da criminalidade entre jovens e adolescentes em nosso País. Mas para alguns Ministros o que deve prevalecer é a autonomia pura e simples que, se assim entendida, perpetuará o atraso e a desigualdade da promoção da Educação Básica no País.

Neste sentido o voto do Ministro Carlos Ayres de Brito foi de uma clareza e sensibilidade para a questão impressionantes. O Ministro diagnosticou perfeitamente a proposta de federalismo sob cooperação pautada pela Emenda Constitucional 53, ressaltando ainda que o FUNDEB se extenderá por 14 anos e a aplicação das receitas estaduais e municipais no FUNDO, passando de 15% mínimos para 20% na educação básica, poderá se desenvolver em três anos.

O que devemos destacar é que a construção do PISO SALARIAL NACIONAL não foi um gesto isolado para a melhoria da educação.

Ao PISO somam-se os Planos de Cargos e Carreira, a previsão da carga horária máxima para o exercício docente e a divisão desta carga horária entre atividades presenciais e aquelas voltadas ao estudo e à preparação acadêmica dos educadores. Esses são os fundamentos essenciais para a promoção da qualidade da educação básica no País. Formam um todo. Fraturá-los é enfraquecer a perspectiva da melhoria.

Ora, ao admitirmos que um professor receba R$ 950,00 mínimos e tenha sua carga horária dividida em 2/3 para aulas e 1/3 para estudos enquanto outro recebe o mesmo PISO mas tem apenas 10% da carga horária remunerada para estudos, estaremos admitindo o rompimento do princípio do PISO e da valorização pretendida por esse instrumento, criando-se uma expressiva desigualdade no investimento pela melhoria da qualidade do ensino.Na verdade, estaremos perpetuando uma República onde os estados, municípios e regiões mais ricas terão sempre educação com mais recursos, de melhor qualidade e com maior valorização dos profissionais da educação.

Neste exato momento, paramos a redação desta matéria e fizemos um pronunciamento na tribuna da Câmara expressando nossa opinião sobre esse tema.
Em alguns minutos acesse o site da Câmara, clique em plenário, pronunciamentos e obtenha nossa manifestação. Caso não consiga, procure posteriormente por nosso nome e clique em "pronunciamentos".

Por isso consideramos lamentável e visão federativa passiva da maioria dos Ministros, sem com isso querermos atacá-los em suas funções ou prerrogativas.

Parabenizamos o Relator, Ministro Joaquim Barbosa, parabenizamos o Ministro Ayres de Brito, pela sensibilidade e pela percepção de que uma federação, para fazer valer a norma constitucional que afirma a educação como um direito social( o lo. deles, no artigo 6o. da Constituição Federal), só poderá fazê-lo mediante a cooperação. Os bons ou maus resultados da educação básica, das creches ao ensino médio, nessa ou naquela cidade, nesse ou naquele estado, terão repercussão efetiva na qualidade da educação nacional, onde ainda são expressivos os índices de repetência e evasão escolares e a distorção idade-série, sem falar nos quase 26 milhões de analfabetos funcionais, a maioria jovens e adultos, em pleno século XXI.

Outro aspecto que impõe retrocesso nessa luta pela educação básica é a previsão de que, até 2009, se poderá pagar o PISO SALARIAL DE R$ 950,00 com todos os atuais proventos nesse valor inseridos.

Já havíamos votado contra essa proposição quando da aprovação da Lei do Piso por entendermos e provarmos, quando do debate ocorrido na Comissão de Educação, que havia receitas federais suficientes para que a União complementasse o pagamento do PISO por estados e municípios, sem inserir nesse valor gratificações e outras vantagens.

Nosso mandato vai dar atenção especial, com seminários, publicações e debates, aos processos de implantação do PISO e das CARREIRAS, combatendo a economia municipal do atraso, que deixa o País dividido em milhares de diferentes níveis de receita, investimento e padrão de qualidade para a educação.

Concluímos reafirmando que a decisão do Supremo foi lamentável e expressa, no nosso ponto de vista, uma visão passiva da federação brasileira, com entes estanques, isolados entre si, apartados da noção de Sistemas de políticas Públicas, um conceito de autonomia administrativa dos entes da República que em nada faz avançar a construção de políticas sociais para o conjunto do Pais.

Nas imagens o Ministro Relator Joaquim Barbosa, o Ministro Ayres Brito e a sessão do Supremo Tribunal Federal.

Um comentário:

Anônimo disse...

"Houve Ministro que ainda abordou o ensino usando nomenclatura que não mais existe na classificação das séries da educação, ao se referir ao 'lo. grau e 2o. grau' ou referindo-se à educação básica como um sinônimo das séries iniciais da educação infantil."
Até quando, Senhor Deputado Paulo Rubem, vamos suportar tanto descaso para com a Educação em nosso Brasil?! Até quanto?!
Ainda bem que há (poucas, mas há) pessoas como V.Exa. engajados no firme propósito de melhorar, também, essa questão. Parabéns!