sexta-feira, 19 de dezembro de 2008
Um banco central heterodoxo : Coisa para País rico
Do jornal "Folha de São Paulo" desta 5a. feira, 18 de dezembro.
Por Paulo Nogueira Batista Junior
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A heterodoxia do Federal Reserve é coisa para rico; aos subdesenvolvidos, a ortodoxia -de galinheiro
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"BRASILEIRO não pode viajar", dizia Nelson Rodrigues. Nada mais verdadeiro, nada mais profundo. Desde que me mudei para os Estados Unidos, estou desenvolvendo pelo Federal Reserve uma admiração de subdesenvolvido nato e hereditário.
O leitor dirá, com certa razão, que o banco central americano não merece lá tanta admiração. Sob o comando de Ben Bernanke, o Fed talvez tenha sido lento na reação à crise financeira na fase inicial. E, sob o comando do seu antecessor, Alan Greenspan, o Fed teve sem dúvida grande responsabilidade na gestação da crise. Greenspan, antes considerado um gênio, está hoje mais sujo que pau de galinheiro.
Mas, convenhamos, tudo é relativo. Comparado com outros bancos centrais, o Fed de Bernanke está demonstrando grande flexibilidade e criatividade. Vem atuando, nos meses recentes, de forma agressiva e heterodoxa, acionando os mais diversos instrumentos e políticas para estabilizar o sistema financeiro e evitar o aprofundamento da recessão nos Estados Unidos.
O Fed ainda está longe de alcançar os resultados pretendidos. Atuando em conjunto com o Tesouro e outras instituições oficiais, o banco central conseguiu evitar o colapso do sistema financeiro, mas o crédito ainda não foi normalizado. A recessão continua se intensificando. O nível de preços ao consumidor (ajustado sazonalmente) caiu em outubro e novembro. Os preços no atacado (o índice de preços ao produtor para bens acabados) vêm caindo desde agosto.
A eficácia dos instrumentos tradicionais de política monetária diminuiu muito, como se sabe. Com a decisão de terça-feira, a meta do Fed para a taxa básica nominal se aproximou de zero. Mas a reativação da demanda depende das taxas de juro de mercado, e estas permanecem ainda bastante elevadas.
Isso levou Bernanke a trabalhar, cada vez mais, com instrumentos não-convencionais de política monetária. O Fed vem criando uma série de mecanismos para injetar liquidez na economia e oferecer crédito a instituições financeiras e outras empresas, com regras mais flexíveis em termos de acesso e aceitação de garantias. Em conseqüência, o balanço do banco central americano registrou expansão fenomenal nos últimos meses.
No seu comunicado de terça-feira, o Federal Open Market Committee (mais ou menos equivalente ao Copom brasileiro) antecipou que as taxas básicas de juro devem permanecer "em níveis excepcionalmente baixos por algum tempo", tentando assim reforçar os efeitos da taxa quase zero sobre as taxas de juro de mercado. Além disso, indicou que pretende "apoiar o funcionamento dos mercados financeiros e estimular a economia por meio de operações de mercado aberto e outras medidas que sustentam o balanço do Federal Reserve em nível elevado".
Isso significará, por exemplo, adquirir grandes quantidades de títulos emitidos por Fannie Mae e Freddie Mac e outros títulos lastreados em hipotecas. Significará, também, a implementação no início de 2009 de uma linha para facilitar a extensão de crédito a pessoas físicas e pequenas empresas.
O Federal Open Market Committee declarou que está avaliando a possibilidade de comprar títulos do Tesouro de prazo mais longo e que continuará a considerar meios de utilizar o seu balanço para apoiar os mercados de crédito e a atividade econômica.
Em suma, leitor, heterodoxia é coisa para rico. Aos subdesenvolvidos, a ortodoxia -de galinheiro.
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PAULO NOGUEIRA BATISTA JR., 53, escreve às quintas-feiras nesta coluna. Diretor-executivo no FMI, representa um grupo de nove países (Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Haiti, Panamá, República Dominicana, Suriname e Trinidad e Tobago).
pnbjr@attglobal.net
Nas imagens
O Autor do artigo, Paulo Nogueira B. Junior e as sedes do Banco Central Americano(Federal Reserve-FED) e do Banco Central do Brasil.
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