sexta-feira, 11 de abril de 2008

CARAVANA DO SIMEPE E DO CREMEPE



Por Paulo Rubem Santiago

O blog transcreve o relatório da Caravana realizada pelo Sindicato dos Médicos e pelo Conselho Regional de Medicina.
Uma boa ferramenta para a reflexão e defesa de mais investimentos em políticas sociais, em vez de se priorizar no orçamento da união o pagamento de juros e serviços da dívida pública.

Segue o relatório.


1- Auto crítica

temos a consciência que ao longo desses 4 anos (2005/06/07/08) em que tivemos a satisfação, a oportunidade e a honra de conhecermos mais davida do povo de nosso Estado, percorrendo 184 municípios, viajando por cerca de 4000 km em 16 semanas, não temos um trabalho com rigor acadêmico ou científico, dado o pouco tempo passado nas cidades, os observadores não serem os mesmos e dada a variação temporal e sazonal do objetivo observado.

Entretanto, tivemos a possibilidade de efetuarmos uma curva de aprendizado que viabilizou acrescentar a cada fase novos olhares e dessa forma ampliando o objetivo inicial de fiscalizar os hospitais, entrevistar gestores e conselhos municipais, além de divulgar a cartilha de direitos dos usuários, agregamos na caravana, a divulgação do disque -denúncia contra abusos sexuais a crianças e adolescentes e ampliamos o olhar também direcionando às questões de educação, violência geral e contra a mulher, combate ao crack, luta pela igualdade racial, analfabetismo de adultos, geração de renda e outros dados que serão expostos a seguir.

Devemos ressaltar a presença não apenas de médicos e funcionários do Cremepe e Simepe mas também de estudantes de Psicologia, Fisioterapia, Enfermagem, Direito, profissionais de arte, de saúde, representante de etnias indígenas, movimentos populares de comunidades, promotores, delegados, advogados,jornalistas, antropólogos, enfim possibilitando também uma intensa relação inter-pessoal e consolidando um grupo homogeneo dentro da diversidade que permitiu um olhar macro e constituir um extrato médio das condições de vida dos nossos cidadãos.

2- Aspectos financeiros e regionalidade

A experiência vivida nos permite fazer uma leitura que identifica no sertão não apenas as maiores dificuldades na ausência do Estado Brasileiro seja no custeio, seja nas condições de cidadania mínima, como quando abordamos as cidades de até 30.000 habitantes que constituem mais de 85% de nossa realidade. A zona da mata iguala a situação descrita, agravada pela condição cultural estabelecida pela monocultura e escravidão submetida aquela população. Dessa forma o agreste ainda dentro desse expectro mostra-se em situação menos preocupante que as duas regiões citadas.

De forma geral, evidenciamos uma economia que não tem sido capaz de oferecer empregabilidade a 40% da população. Nesses interiores encontramos cerca de 10 a 20% vivendo como funcionários municipais, outros 10% pensionistas do INSS e cerca de 40% sobrevivendo do programa bolsa família. Os restantes 30 a 40% constituem a legião de pobres desassistidos que curiosamente iguala ao percentual da população que vive na periferia das grandes cidades.

É preciso ressaltar que num Estado com 8 milhões de habitantes, temos 3,2 milhões de irmãos passando grande necessidade e para se ter uma idéia do que representa essa situação dessas 800.000 famílias, com os 9 bilhões a serem investidos pelo PAC em PE , haverá a criação de 200.000 empregos e consequentemente ainda teremos uma demanda de 600.000 empregos. Mesmo reconhecendo os esforços dos Governos Federal e Estadual para implantar um crescimento economico em nosso Estado , ressalvamos que o Programa bolsa-família se não buscar uma contra-partida de horas de trabalho por parte dos cidadãos estimulará muito a ociosidade e acomodação no seio da cultura do povo.

Saímos desse processo com a certeza que urge efetivar a reforma agrária e estabelecer meios de criar cooperativas respeitando a vocação economica dessas cidades para que possam efetivamente permitir que os programas assistenciais sociais sejam substituidos pela possibilidade de emprego e renda

3-Infra-estrutura

É impressionante a repetição em quase 90% das cidades dos mesmos problemas:
Água ofertada de 7/7 dias ou 15/15 dias. Em algumas há mais de 2 meses sem oferta de água, saneamento praticamente inexistente, coleta de lixo e tratamento de lixo ausentes. As estradas precisam urgentemente serem sinalizadas e recuperadas. Projetos habitacionais necessitam ser implementados naszonas rurais.

4- Saúde

Decerto todos os brasileiros conhecem a crise da saúde que vai desde o sub-custeio, passando por um modelo de gestão insatisfatório, Recursos humanos insuficentes em número, remuneração, qualificação e reciclagem até a total falta de cumprimento a Conferência Nacional de saúde que preconizou a qualificação dos conselhos municipais de saúde. Por tudo isso a saúde da população é entregue a providência divina.

O PSF que tem melhorado sobremaneira os indicadores de saúde, não apresenta equipes de profissionais de saúde completas, não viabiliza a psicoterapia tão necessária e garantida por lei a população e necessita deixar de ser um programa para se constituir em política pública permanente.Impõe-se que recursos humanos de saúde e educação sejam prioridades do Estado Brasileiro como carreiras de Estado e jamais terceirizados como tem sido a lógica vigente.

Não existe correia de transmissão entre o PSF e o atendimento de média complexidade, o que provoca um monumental gasto com transporte de pacientes rumo aos hospitais regionais, sucateados e sem resolutividade provocando assim a sobrecarga nas emergências da capital.
Tem faltado por atrazo a farmácia básica nos municípios como também exames básicos bioquímicos, rx e ultrassonografia.

5-Educação

Em grande parte dos municípios o analfabetismo de adultos supera 50% dapopulação e a correlação com elevados índices de mortalidade infantil se fazem presente. A merenda escolar é custeada pelo governo federal com 22 centavos por criança por dia o que justifica a pouca qualidade e quantidade e cobertura por todos os dias já que tem que ser repartido com alunos do ensino médio posto que o Estado não tem enviado verba para esse fim nas escolas estaduais conforme relato dos prefeitos.

Se a merenda escolar é desse nível de gravidade, o salário dos professores, salvo poucos municípios pagam em torno de 500 reais aos professores e o transporte escolar que é proibido por lei ser efetuado em paus-de-arara, por conta da verba liberada para os prefeitos da ordem de um quinto do necessário , tem sido efetuado essa modalidade de transporte que constitui-se em verdadeiro atestado de humilhação ao ser humano, postulado e tratado como gado ou cidadão de segunda categoria.

6-abusos sexuais, prostituição infantil

Em quase todas as cidades ocorre livremente essa chaga que a OMS/ONU estima que incida em 20 por cento das mulheres. Diversos pontos de prostituição foram constatados e enviados a Delegacia da mulher. ´E impressionante a incidência de violência contra a mulher, de forma geral mas principalmente relacionada ao alcoolismo. Em todas as cidades houve reclamação pela falta de lazer nas cidades o que leva ao consumo de alcool e a sexualização precoce.

7-violência geral e drogas

Extremamente preocupante a chegada do crack nas cidades de todas as regiões. Sabemos que o custo mais barato que a maconha, o poder viciante e devastador no potencial demencial e letal dessa droga é adicionalemte preocupante pelo fato de chegar às crianças de 8 a 10 anos de idade.

Por outro lado 40% de nossas cidades não tem delegados, promotores e juizes morando por falta de concurso público, sobrecarregando essas autoridades que são obrigadas a acumular vários municípios. Também o efetivo policial nas cidades é bastante reduzido mas chama a atenção a interação maior com a população em relação a capital onde a Polícia Militar necessita urgentemente formar seus quadros sem preconceito contra pobres pois impressiona os casos recorrentes de abuso de autoridade cometido dentro de comunidades na periferia. Os assaltos tem apresentado crescimento nas cidades percorridas

8- conclusão

Não há dúvidas que o Brasil vem apresentando crescimento e estabilização economicas e que também há um ufanismo governamental exacerbado, buscando um efeito psicosocial não condizente com a realidade mas sim construindo um coeficiente fatorial de esperança.Todavia é preciso ter constantemente presente em nossas consciências que o Brasil tem a maior taxa tributária do mundo onde aqueles que trabalham , como amplamente divulgado , trabalham por três meses para custear um Brasil que não tem resolvido com qualidade os problemas de quase metade da população e ainda que se projete para 30 a 40 anos um ritmo de inclusão mais consistente, fica a pergunta:

O que temos a dizer aos humanos de meia idade, seus filhos e netos que passarão pela vida sem a possibilidade da dignidade e da cidadania necessária?

Diremos que infelizmente o que temos a oferecer é que seus bisnetos viverão num país melhor? Não!! precisamos garantir que a velocidade de inclusão seja maior que a do desenvolvimento e que este respeite o meio ambiente e não sirva a uma maior concentração de renda. Precisamos cumprir as leis , não apenas os cidadão mas prinicipalemte as instituições. Precisamos acabar com a impunidade, corrupção para construir um Brasil justo socialmente, digno e cidadão


RICARDO PAIVA

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