quarta-feira, 7 de maio de 2008

A mágica do "investment grade"



O Blog compartilha com satisfação o excelente artigo publicado hoje, 7 de maio, na "Folha de Sâo Paulo", no Caderno "Dinheiro", de autoria do Economista Paulo Rabello de Castro, que escreve quinzenalmente, às quartas-feiras, nesse jornal, com o título acima.

A política econômica brasileira ainda não é "investment grade". Sua política social e de rendas, menos ainda.


SABER ADMINISTRAR o sucesso pode ser até mais complicado do que conviver com a escassez e a penúria. Na esteira da nota "investment grade", atribuída à dívida externa brasileira por uma das agências americanas de risco, a entrada de capitais no país -uma medida do "sucesso" da política econômica- pode assumir proporções nunca antes experimentadas pelo nosso Banco Central.

Nesse sentido, ser considerado um país que emite dívida com baixo risco de calote pode se tornar, mais adiante, motivo de frustração e desapontamento, se a onda especulativa dos aplicadores, daqui e lá de fora, vier a transformar o atual otimismo escancarado em pura histeria especulativa. Esse é, neste momento, um cenário nada improvável no horizonte até o fim de 2008.

Não é para menos. Por algumas estimativas internas, a economia brasileira poderia estar recebendo um fluxo agigantado de recursos em razão dessa "autorização para especular" contida na concessão de grau de investimento seguro para a dívida brasileira. Estimamos algo como US$ 20 bilhões por ano adicionais ao fluxo atual. Porém, como o Banco Central está ampliando o diferencial entre o juro brasileiro e o americano, em vez de diminuí-lo, ficamos na iminência de um ataque especulativo ao contrário. E por quê? Sob o argumento de conter a demanda e os gastos privados, o BC promove -sem querer- um subsídio ainda maior à vinda de recursos especulativos que não precisariam, neste momento, de nenhum incentivo para vir passear no mercado emergente brasileiro.

Passamos do risco de calote ao risco de cassino. De comunidade carente, o Brasil galgou à condição de subúrbio dos capitais internacionais. Mas ainda é subúrbio e pode ter o equilíbrio de sua frágil vida produtiva extremamente desarrumado pela festa financeira que se arma agora à sua porta. A onda de valorização do real desequilibrará ainda mais as estruturas produtivas da indústria local, mesmo que beneficiada por importações de equipamentos mais baratos. O Brasil faz do jeito que os Estados Unidos fizeram nos últimos anos: acelera importações, recria um déficit em conta corrente e não combate o déficit público como deveria. Tudo financiado por farto capital externo. Com um agravante: no Brasil, diferentemente dos Estados Unidos, toda a festa é bancada com altíssima taxa real de juros e, portanto, com acumulação de encargos financeiros vultosos para gerações futuras. Nos Estados Unidos, essa fórmula deu as alegrias que deu, na era Greenspan/Bush, e, neste momento, um doloroso ajuste se impõe ao povo americano como conseqüência da ilusória fortuna.

Aqui, nossa euforia em gastar antes de poupar, e de abrir portas ao capital esperto que vem de fora, crendo -sem desconfiar- que viramos o "país das grandes oportunidades" só por nos terem atribuído uma nota de segurança financeira, pode ser apenas mais uma senda colorida para o desastre financeiro, ali adiante.
A política econômica brasileira ainda não é "investment grade". Sua política social e de rendas, menos ainda.

A política de juros e o nível das taxas no Brasil ainda refletem a condição de um convalescente do descalabro financeiro das últimas décadas. Portanto, ser considerado "investimento seguro", neste momento, é algo bem arriscado. Não há nada de mágico no atual momento brasileiro. O que há é muita mágica.



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PAULO RABELLO DE CASTRO , 59, doutor em economia pela Universidade de Chicago (EUA), é vice-presidente do Instituto Atlântico e chairman da SR Rating, classificadora de riscos. Preside também a RC Consultores, consultoria econômica, e o Conselho de Planejamento Estratégico da Fecomercio SP. Escreve às quartas-feiras, a cada 15 dias, nesta coluna.

paulo@rcconsultores.com.br

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