sexta-feira, 23 de maio de 2008

Paraísos fiscais são o inferno dos pobres

Do site www.cartamaior.com.br

Paraísos fiscais são o inferno dos pobres

Ausência de controle sobre capital que circula em paraísos fiscais causa perdas de US$ 250 bilhões ao ano, quantia que multiplica por cinco o valor necessário para financiar os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, estabelecido pela Organização das Nações Unidas.

David Cronin (IPS)

BRUXELAS (IPS) – Os paraísos fiscais privam os países pobres de mais fundos dos que recebem em forma de ajuda ao desenvolvimento, segundo a rede de economistas, contadores e acadêmicos Tax Justice Network. Esta instituição estimou em US$ 11,5 bilhões as contas bancárias off shore (manejadas desde o país do correntista mas radicadas em instituições do exterior, especialmente em paraísos fiscais onde não pagam impostos) em todo o mundo. As autoridades fiscais dos países, incapazes de controlar esse dinheiro, perdem US$ 250 bilhões ao ano, quantia que multiplica por cinco a necessária para financiar os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, calculada pela Organização das Nações Unidas.

O porta voz da Tax Justice Network, John Christensen, afirmou que a União Européia exibe uma atitude “ligeiramente esquizofrênica” em relação aos problemas que originam a evasão fiscal e a falta de controles. Instituições do bloco “lideraram o mundo” em suas iniciativas contra a evasão fiscal, mas muitos dos mais notórios paraísos fiscais estão em países da UE ou em territórios de ultramar de seus membros, recordou Christensen. Entre eles figuram Andorra, Luxemburgo e Mônaco, além de jurisdições britânicas como a City de Londres (o distrito financeiro da capital britânica), as ilhas Caimã, Jersey, Guernsey e Man.

Christensen, ex-empregado do setor bancário de Jersey, recordou uma investigação da Universidade de Massachussets (EUA) segundo a qual a África teve US$ 607 bilhões em fugas de capitais desde 1970, cinco vezes a quantidade que recebeu em ajuda no mesmo período. A fuga de capital envolve o movimento de dinheiro de um país para outro no qual uma empresa ou um investidor acredita que conseguirá melhor retorno. Segundo Christensen, a Grã-Bretanha é um dos principais culpados por atrair esta fuga por não regulamentar de maneira suficiente as companhias financeiras radicadas na City. “A City de Londres é o maior paraíso fiscal do mundo. Agrada à Grã-Bretanha atrair capitais africanos, asiáticos e latino-americanos, e ninguém ali pergunta se esse capital procede de atividades criminosas”, afirmou.

Christensen expressou seu apoio ao código de conduta da UE sobre pagamento de impostos criado em 1998, que recomenda aos países e seus territórios dependentes que desistam de práticas fiscais consideradas prejudiciais, como oferecer benefícios especiais a não-residentes. No ano passado, a Comissão Européia, o braço executivo da União Européia, considerou que a ilha de Man não cumpria o código. Christensen cobrou da Comissão uma análise do caso de Jersey e Guernsey, que operam com regimes fiscais semelhantes aos de Man, incluída a isenção de impostos para muitas empresas.

O especialista também pediu urgência a esse organismo para aceitar a solicitação feita em 2007 pelo Parlamento Europeu de criar regras mais rígidas para as empresas que operam no setor das indústrias extrativas, como as mineiras e petrolíferas. Os europarlamentares pedem que seja exigido de todas as companhias o registro dos impostos que pagam em cada país onde operam, o que “reduziria radicalmente a capacidade as multinacionais de tirar seu lucro das nações em desenvolvimento”, de acordo com Christensen.

Stephen Store, funcionário da Comissão Européia encarregado de políticas impositivas, disse que o bloco tem faculdades limitadas na matéria. A responsabilidade é mais dos 27 governos do que das instituições em Bruxelas. Mesmo assim, disse, o código de conduta não foi benéfico, pois inclui clausulas contra práticas impositivas perniciosas que, entretanto, são incluídas em acordos comerciais e de cooperação política assinados com países de fora da UE. “Os autores do código sabiam que a cooperação em matéria impositiva não se deteria pelas fronteiras”, afirmou Store.

A não-governamental Rede Européia sobre Dívida e Desenvolvimento (Eurodad) lamentou que a justiça financeira não tenha atenção suficiente e com afinco por parte do bloco. Embora os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio da Organização das Nações Unidas estipulem que os governos de todo o mundo devem criar regulamentações financeiras mais rígidas, o último documento sobre o assunto elaborado pela Comissão Européia, de 9 de abril, não inclui proposta alguma a respeito. A Eurodad também expressou sua frustração pela lentidão nos estudos do Banco Mundial e do Fundo Monetário Internacional sobre os efeitos da evasão fiscal nas nações pobres.

O presidente do Banco Mundial, Roberto Zoellick, disse em setembro passado que se inclinava por realizar esse tipo de estudo. Mas os ativistas consideraram que desde então não foi feito o suficiente. A Eurodad também pediu urgência à França – que em julho assumirá a presidência rotativa da UE – em insistir nestes assuntos. O presidente francês, Nicolas Sarkozy, pediu em fevereiro ao FMI que estudasse a possibilidade de instaurar um imposto mundial sobre o lucro das empresas de petróleo. No entanto, ativistas questionam a França por seu apoio aos paraísos fiscais de Mônaco e Andorra

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